Sumário
Trauma, memória e terapia de EMDR
Suas memórias formam sua identidade pessoal. Elas não são permanentes e precisas, mas funcionam como uma bússola que o(a) guia em novas situações e ajuda a montar suas experiências para que você possa planejar seus próximos passos. São suas memórias que o(a) fazem encontrar seu caminho no mundo. A seguir, apresento os tipos de memórias.
Tipos de memórias
1- MEMÓRIAS EXPLICITAS
1.1.MEMÓRIAS EXPLÍCITAS DECLARATIVAS:
As memórias declarativas permitem a recordação dos eventos de modo consciente, contar histórias sobre esses eventos, com início, meio e fim. O papel dessas memórias é comunicar fatos as outras pessoas. É um tipo de memória que não está ligado a um evento específico, são informações que adquirimos ao longo do tempo, não são carregadas de sentimentos e emoções.
As memórias declarativas são organizadas, conscientes e voluntárias, tem informações sobre fatos e são frias.
Exemplo: Quando você é questionado sobre qual é a capital do Japão, ou quando você informa alguém que a agua ferve a 100 graus. São memórias de aprendizagem.
Essas memórias são quase que irrelevantes para os tratamentos de traumas.
1.2.MEMÓRIAS EXPLÍCITAS EPISÓDICAS
São memórias que possuem sentimentos, sejam positivos ou negativos. Essas memórias são a fronteira entre o racional (memória explícita declarativa) e irracional (Memórias implícitas emocionais).
Memórias episódicas, também chamadas de autobiográficas, surge de forma espontânea. Essas memórias demonstram sentimentos vagos, muitas vezes de caráter onírico (referente à sonhos). São memórias menos conscientes do que as explicitas declarativas e mais conscientes do que as memórias implícitas que veremos a seguir.
A memória episódica nos ajuda a nos orientar, é quando selecionamos o que aprendemos do passado e projetamos para o futuro.
Acredita-se que a memória episódica mais precoce pode acontecer a partir dos 3 anos e meio, quando o hipocampo se torna funcional.
As memórias episódicas acontecem com outras espécies também, estudos feitos com golfinhos, elefantes, abelhas constatam que a memória episódica tem raízes evolutivas.
Exemplo: a lembrança do primeiro dia de aula da faculdade, ou da festa de 1 ano do seu filho, ou do dia do seu casamento.
Uma memória episódica minha, por exemplo, é quando eu conto a história da inauguração do clube Thermas dos Laranjais. No evento da inauguração, em 1987, o fundador do clube, Benito colocou a pedra fundamental diante de um totem. Ao lado dele estavam o prefeito da cidade. Teve um baile do Havai nas 2 piscinas que já estavam prontas. Eu tinha 15 anos e fui com uma roupa azul, com top e barriga de fora. O baile estava muito bom, decoração linda música boa, até que começou uma briga. Os moços de Olímpia, brigando com os arquirrivais rio-pretenses( os moços de rio preto). Era uma briga antiga, pois os moços de São José do Rio Preto iam paquerar as moças olimpienses nos bares e bailes e sempre acabava em briga. A briga começou isolada, mas quando era por esse motivo os moços se uniam para expulsar os intrusos. Voou fruta para todo lado, cadeiras e mesas dentro da piscina, acabaram com a festa literalmente. É uma memória que traz sentimentos bons como alegria pela beleza da festa e raiva porque um bando de imaturos desequilibrados acabaram com a diversão.
Agora eu tenho outra memória episódica para contar. O dia em que fui no The Town em São Paulo. Uma experiência incrível, que além de memória episódica foi também procedural pois foi uma superação para mim.
2. MEMÓRIAS IMPLICITAS
2.1. MEMÓRIA IMPLICITA EMOCIONAL
Afetam os nossos comportamentos
A memória implícita emocional refere-se ao armazenamento e recuperação de informações relacionadas a emoções, sentimentos e experiências afetivas. Ela está associada a lembranças que estão ligadas a estados emocionais, mas que não são necessariamente lembradas. Essas memórias podem ser acionadas por estímulos emocionais, situações ou objetos que evocam uma resposta emocional. A memória emocional implícita tende a ser processada de forma automática e involuntária, muitas vezes sem que a pessoa esteja ciente de que certas emoções são experimentadas em determinadas situações.
Se as memórias emocionais são sinais, as procedurais são os impulsos, movimentos e as sensações corporais que guiam nossas ações, atrações, repulsas e habilidades.
Exemplo
Fobia de aranhas: Uma pessoa pode desenvolver uma fobia intensa de aranhas após uma experiência traumática com uma aranha, como uma picada dolorosa na infância. Mesmo que essa pessoa não se lembre conscientemente da experiência específica, a emoção intensa associada à situação traumática pode persistir, causando medo irracional de aranhas ao longo da vida.
Reações emocionais a gatilhos específicos: Um veterano de guerra pode experimentar uma reação emocional intensa, como ansiedade ou raiva, ao ouvir um som semelhante ao de tiros de armas de fogo, mesmo que não se lembre conscientemente das batalhas reais ou dos detalhes específicos dessas experiências. Essa é uma memória implícita emocional que pode ser desencadeada por estímulos sensoriais semelhantes.
Esses exemplos demonstram como as memórias implícitas emocionais podem moldar as respostas emocionais das pessoas, mesmo quando não têm consciência completa das experiências passadas que as causaram.
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2.2. MEMÓRIA IMPLICITA PROCEDURAL
Afeta a configuração da nossa vida. As memórias procedurais se dividem em três categorias:
- As atividades motoras aprendidas.
Ex: Dançar, esquiar, andar de bicicleta, etc.
- Respostas que convocam nosso instinto de sobrevivência diante de uma ameaça. São padrões que incluem suportar, contrair, lutar, fugir e paralisar. Essas respostas tem um papel importante na formação e na resolução de memórias traumáticas.
Ex: Fobias, como por exemplo a fobia de cachorro. Apesar do animal não oferecer perigo, existe uma memória implícita de quando você foi atacado quando criança.
- Respostas no organismo de aproximação ou evitação, atração ou repulsão. No nível físico, nos aproximamos de uma provável fonte que nos faz bem e evitamos fonte de toxicidade
Ex: Quando você se encontra com alguém e apesar de não se lembrar do nome ou de onde você conhece a pessoa sente uma repulsa e sentimentos negativos.
As memórias emocionais influenciam os nossos comportamentos e as procedurais tem um impacto profundo na estrutura da nossa vida. As memórias procedurais estão abaixo da consciência e é fundamental para o trabalho com memórias traumáticas.
MEMÓRIAS E PSICOTERAPIA EMDR
As memórias desempenham um papel fundamental na terapia EMDR (Eye Movement Desensitization and Reprocessing), pois essa abordagem terapêutica foi desenvolvida especificamente para ajudar as pessoas a processar memórias traumáticas e superar os sintomas associados a essas experiências. Aqui estão algumas razões pelas quais as memórias são tão importantes na terapia EMDR:
- Trauma é armazenado nas memórias: Traumas passados, especialmente aqueles que não foram adequadamente processados no momento em que ocorreram, podem ser armazenados no cérebro de forma fragmentada e disfuncional. Essas memórias traumáticas podem continuar a causar sofrimento e sintomas psicológicos, como transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), ansiedade e depressão.
- Dessensibilização e reprocessamento: O objetivo central da terapia EMDR é ajudar os pacientes a dessensibilizar e reprocessar memórias traumáticas. Isso significa que as memórias dolorosas são abordadas e transformadas em memórias menos perturbadoras. Esse processo permite que os pacientes processem e integrem as experiências traumáticas de forma mais saudável.
- Acessar recursos adaptativos: Durante a terapia EMDR, os terapeutas ajudam os pacientes a acessar recursos internos que podem ser usados para lidar com memórias traumáticas. Isso pode incluir a identificação de crenças negativas sobre si mesmos ou o mundo que foram formadas como resultado do trauma. Ao reprocessar essas memórias, os pacientes podem substituir essas crenças por outras mais adaptativas.
- Redução de sintomas: Trabalhar com memórias traumáticas através da terapia EMDR frequentemente resulta na redução dos sintomas associados a essas memórias. Isso pode incluir sintomas como pesadelos, flashbacks, ansiedade, pânico e evitação de situações relacionadas ao trauma.
- Melhoria da qualidade de vida: Ao trabalhar com memórias traumáticas e reduzir os sintomas associados, a terapia EMDR pode melhorar significativamente a qualidade de vida dos pacientes. Eles podem experimentar um alívio significativo do sofrimento psicológico e emocional, o que lhes permite funcionar melhor no dia a dia.
Em resumo, as memórias desempenham um papel crucial na terapia EMDR, pois o foco dessa abordagem é ajudar os pacientes a processar e integrar memórias traumáticas para alcançar a cura emocional e a recuperação. Ao fazê-lo, a terapia EMDR pode trazer alívio significativo para aqueles que sofrem com os efeitos de traumas passados.
Venha conhecer o que o EMDR pode fazer por você!
Claudia Carraro
Psicoterapeuta Certificada de EMDR e especialista em carreiras
Fonte consultada
LEVINE, P.A. Trauma e memória: cérebro e corpo em busca de um passado vivo: um guia prático para compreender e trabalhar a memória traumática. São Paulo:Summus, 2023.